Ontem, hoje e amanhã
Ontem fui professor contratado, feliz e com esperança de um dia vir a ser efetivado. Ontem foi há vinte anos.
Ontem tinha o sangue na guelra e apetecia-me trabalhar com um colega efetivo ao meu lado, a ganhar mais do que eu, mas não me importava porque pensava que seria durante pouco tempo.
Ontem, era um puto recém Licenciado, com sonhos de caraças acerca do meu futuro profissional e por arrasto pessoal.
Ontem, na ingenuidade dos meus vinte e tal anos, fui-me inscrever num sindicato de professores, convencido pela lógica do pensamento que eles me queriam defender.
Ontem fui ingénuo, mas convicto da solidariedade dos homens e mulheres das organizações que nos deveriam defender.
Ontem não esperava esperar e desesperar por uma vinculação.
Ontem não esperava ver a promiscuidade sindical com o governo até ver um dirigente sindical de Santarém a transitar da cadeira sindical para a cadeira acolchoada do Ministério da educação num desses governos já idos.
Ontem, não esperava que uma organização sindical da envergadura da FENPROF se “esquecesse” durante 12 anos de exigir a vinculação dos contratados ao abrigo da Diretiva Europeia datada de 1999 que obrigava a tal.
Ontem, tive esperança numa vinculação quando o governo de Guterres caiu em 2001.
Ontem vi muitos ministros da educação ficarem assombrados quando se lhes falava da vinculação dos professores contratados como se cheirassem mal para a economia.
Ontem, (ou terá sido antes de ontem?), coloquei uma petição na AR a pedir a vinculação dos professores contratados, e tive esperança reservada de que os palhaços tirassem as máscaras da indiferença ou fizessem algo para minorar o sofrimento dos contratados de longa duração.
Muito antes de ontem, tive esperança num mundo melhor, mas os sacanas dos políticos, sindicalistas de meia tigela, e até alguns colegas de profissão, passaram a achar que um contratado merece ter a vida congelada até apodrecer e deitar fora.
Ontem, se não me falha a memória ouvi de certos parasitas do sistema que os recém ex-contratados não podiam por em causa a posição cimeira dos professores enquadrados (entenda-se do quadro), que por isso teriam de concorrer numa prioridade sempre acima daqueles.
Ontem vi os sindicatos a apoiar a supremacia da raça enquadrada.
Antes de hoje, assisti a humilhações na avaliação de desempenho de professores contratados 1000 vezes mais competentes que os seus carrascos, entenda-se, professores dos quadros.
Muito antes do dia atual, vi 100000 a correrem para Lisboa para se defenderem de uma avaliação de professores – também fui por não acreditar que também estivessem lá para defenderem a eliminação da precariedade dos contratados, mas tão somente para ver o rosto da hipocrisia.
Ontem tive amigos do quadro que me apoiaram, sinceramente, mas eram poucos!
Ontem fiquei banzado com o descaramento das organizações sindicais que usaram os contratados como moeda de troca para conseguirem dividendos para os professores efetivos, de preferência aqueles que estavam nos escalões mais altos.
Há muito tempo atrás fiquei banzado pela arrogância sindical ao anunciarem acordos que trariam a alguns professores contratados a estabilidade, quando sabiam que isso eram balelas de politicozecos de olhinhos meigos.
Ontem comeram-se pizas e professores contratados ao jantar!
Na altura, os contratados não eram indigestos como agora, que até já tem uma associação que os defende.
No passado, muito antes de anteontem, os professores contratados não tinham as redes sociais para se conhecerem, trocarem impressões em relação a sua desgraça laboral.
O mundo evoluiu desde esse passado doloroso, sujo, sem esperança de melhores dias, com hipocrisias sindicais e governamentais na mistura da gamela.
Hoje, existe uma Associação Nacional de Professores Contratados, que luta verdadeiramente por estes profissionais, porque é composta por homens e mulheres que já tinham deixado de sonhar com a estabilidade e acordaram para se defenderem de quem os quer por fora, de quem lhes quer tirar a vida profissional e um pedaço da outra.
Amanhã, para termos essa vida precisamos do folego de todos os professores contratados, por isso deves aderir À ANVPC, para continuarmos a lutar por ti.
Primeiro outorgante: ANVPC – Associação Nacional de Professores Contratados
Segundo outorgante: professor ontem contratado, hoje revoltado, amanhã em quadro de honra